O
entrevistado do Jornal Daqui desse mês é Ivonildo Di Lira ou simplesmente Lira,
como é mais conhecido, de origem humilde, nasceu há 12 de abril de 1962, em São
Rafael (RN) e, desde o ano de 1986, mora em São Sebastião - DF.
Jornal Daqui: Desde quando você mora em
São Sebastião e, do ponto de vista histórico, quais foram os principais
acontecimentos da cidade?
LIRA: Desde o ano de 1986, quando São Sebastião ainda
era chamada de Agrovila e totalmente dependente do Paranoá. Vivíamos de pires
na mão. Se quiséssemos um caminhão de cascalho ou qualquer outro benefício tínhamos
que nos humilhar para o administrador de lá. Os ônibus da TCB só circulavam
duas vezes ao dia, um no período da manhã e, o outro, no período da tarde. Era
uma vida de muito sofrimento. Sem contar, também, que a população não dormia direito
por causa da pretensão do GDF de construir a barragem do rio São Bartolomeu que,
caso tivesse ido adiante com o seu projeto, teríamos saído daqui sem direito a
nada, já que, para o governo, éramos todos invasores. Foi aí que tomei a iniciativa
de criar a Comissão Pró Independência para lutar por uma administração própria
e também para impedir a construção da barragem. Foram anos de luta, até que, em
junho de 1993, por causa da pressão popular, o governo sancionou a Lei de nº
167/93, criando a Região Administrativa de São Sebastião – RAXIV, para alívio
de todos os moradores.
Jornal Daqui: Depois de
criada a RA-XIV, quais foram os principais problemas enfrentados pela população
e o que foi feito para solucioná-los?
LIRA: Muitos! A começar pela falta de
infraestrura, saneamento básico e moradia. Lembro-me, por exemplo, que tivemos
que nos organizar em forma de associações de bairros para cobrar do governo as
benfeitorias. Toda vez que o governador se fazia presente na cidade, lá
estávamos nós, as lideranças comunitárias, com as nossas faixas e cartazes
cobrando água potável, asfalto, iluminação pública e segurança. Problemas estes
que até hoje não foram solucionados por completo por causa do crescimento
desordenado da cidade. Fundei e ajudei a fundar diversas associações na
comunidade, dentre elas, a Associação de Moradores do Bairro Vila Nova (AMVNO),
Associação de Moradores do bairro Bela Vista e a Prefeitura Comunitária do
Bosque, que serviram de instrumentos de pressão junto ao governo. Grande parte
das nossas reivindicações foi atendida graças à união das lideranças
comunitárias e, sendo assim, sinto orgulho de ter sido uma delas. O mote
daquela época era: “um por todos e, todos por um”! Assim, dessa forma,
conseguimos muitas coisas para a nossa cidade.
Jornal Daqui: Quais são
as suas principais preocupações com a cidade de São Sebastião atualmente?
LIRA: São com as invasões e com os
parcelamentos irregulares de terras públicas que fazem com que a cidade cresça
de maneira desordenada e sem espaço para a instalação de equipamentos públicos
como creches, escolas e hospital. Também tem o problema da falta de
infraestrutura, saneamento básico e urbanização em bairros como o Morro da
Cruz, São Gabriel, Bela Vista, Capão Cumprido, Vila do Bôa, Condomínio Itaipú e
Residencial Vitória. A área rural é outro exemplo de preocupação, onde as
estradas estão péssimas e, a exemplo da área urbana, também sofre com a falta
de transporte. Os problemas, na verdade, sempre existiram e vão continuar
existindo, independentemente de quem esteja à frente do governo. Mas se eles
existem, deve haver, também, a solução dos mesmos e, para isso, se faz
necessário que o governo invista consideravelmente em obras de pequeno e grande
porte por toda a cidade. Os engarrafamentos em frente do balão da ESAF tende a
aumentar cada vez mais, principalmente com o surgimento de novos bairros. A
solução, neste caso, é a construção de viadutos e de galerias subterrâneas
ligando o Lago Sul ao bairro Jardim Botânico.
Jornal Daqui: A sua luta
pela moradia continua? E o que foi feito dos bairros Crixá e Nacional?
LIRA: A cobrança por moradia popular é
muito grande e o governo, por sua vez, não tem acompanhado a demanda da
população como deveria. Há 12 anos atrás eu tive a ideia de criar os bairros
Crixá, Nacional e Dom Pedro II, voltados para os inquilinos de São Sebastião e
para as polícias civil e militar mas, infelizmente, sofri todo tipo de
perseguição por defende-los. E o governo anterior, ao invés de abraçar a ideia,
fez foi doar as áreas destinadas aos bairros para chacareiros de Samambaia e
para a Olaria Icena, de forma ilegal. Entrei na justiça contra o GDF com base
na Lei de nº 401\2001. O atual governo publicou edital para contratar, por meio
de licitação, a empresa que vai construir os prédios, através do programa Minha
Casa, Minha Vida. As novas unidades habitacionais serão destinadas às famílias
que ganham entre zero e três salários mínimos. Eu sempre deixei claro, nas
minhas reuniões, que elas seriam entregues através da lista da CODHAB e não por
meio de cooperativas. Estou com a minha consciência tranquila quanto a isso
porque fiz e continuo fazendo a minha parte. Já o bairro Dom Pedro II foi
implantado com o nome de Jardins Mangueiral, através do Programa Morar Bem, mas
voltado para a classe média. Mas como as pessoas mais humildes precisam de um
lugar para morar, se sentiram obrigadas a invadir área pública ou comprar lotes
de grileiros, por falta de opção. E o governo, por sua vez, fez vista grossa e,
agora, não lhe resta outra alternativa a não ser regularizar a situação dessas
famílias. Eu sou a favor do direito à moradia, mesmo que essa moradia tenha
sido adquirida de maneira irregular como, por exemplo, as que foram adquiridas
no Morro da Cruz e Capão Cumprido. Por isso sou totalmente contra a derrubada
de casas nessas localidades e, no que depender de mim, irei fazer de tudo para
proteger os moradores.
Jornal Daqui: Você
acredita que São Sebastião tem potencial para eleger um deputado distrital¿
LIRA: Sim, com certeza! Da mesma forma que
os sindicatos, igrejas e empresários se organizam para eleger os seus
representantes, a população de São Sebastião também deve se organizar para
eleger o seu deputado distrital e federal, para ter voz tanto na Câmara
Legislativa quanto no Congresso Nacional. Mas para isso precisa focar em um
único candidato da cidade e esquecer os de fora porque, do contrário, vai ficar
mais quatro anos desamparada. Apesar da necessidade que temos de eleger um
deputado, não significa, necessariamente, que temos que apoiar o primeiro que
aparecer só porque é morador da cidade. Tem que ser alguém com chances reais de
chegar lá e que tenha, além da ficha limpa, projetos e visão de futuro. Outra
coisa que poderá nos atrapalhar em 2014 é a pulverização dos votos. Um ano
antes das eleições os partidos políticos saem à caça de líderes comunitários
com aspiração política para concorrem por suas legendas, mesmo sabendo que a
maioria deles não tem a mínima chance de se eleger. Mas os votos deles servirão
para eleger quem realmente o partido quer que seja eleito, no caso, o
empresário ou o líder religioso que injetou grande quantidade de dinheiro na
sigla. É o pequeno enchendo o balaio do grande. Se esse artifício é ótimo para
os partidos, é péssimo para a cidade porque não consegue eleger ninguém! Os
eleitores não devem votar numa pessoa que se candidatou por vaidade pessoal ou
porque esteja fazendo o jogo dos partidos políticos, que precisam atingir o
coeficiente eleitoral a qualquer custo. Por isso é importante que São Sebastião
despeje os seus 55 mil votos em um único candidato da cidade para garantir, de
fato, a eleição de seu representante.
Jornal Daqui: Você foi o
candidato de São Sebastião mais bem votado nas eleições de 2010 e, em relação a
2014, pretende se candidatar novamente¿
LIRA: Envolvi-me com a política porque,
como líder comunitário, os meus poderes eram limitados e não tinha como fazer
mais pela comunidade. Vi que, como deputado distrital, poderia fazer muito
mais. Por isso é que entrei para o mundo da política. Eu não me candidatei nas
eleições de 2010 por vaidade pessoal ou para fazer o jogo de partido político,
mas por necessidade da própria cidade de ter um representante na Câmara
Legislativa. Em relação a 2014, diria que a tendência natural é me candidatar
novamente, até porque não tem nada que me impeça de ser candidato. Se a
comunidade achar que devo disputar mais uma vez a vaga de deputado, farei isso
com o maior prazer. Me sinto muito mais preparado agora do que em 2010.
Jornal Daqui: Quais
foram as benfeitorias que vieram para São Sebastião a partir das suas
reivindicações¿
LIRA: Na condição de líder comunitário
lutei para conseguir vários benefícios para a cidade de São Sebastião como, por
exemplo, a criação da Administração Regional - RA-XIV; CAIC Unesco; Parque de
Exposições Agropecuárias; Área de Desenvolvimento Econômico - ADE/PRÓ-DF;
Transferência dos moradores da Área de Risco para o bairro Residencial Oeste;
Criação dos bairros Crixá, Nacional e Dom Pedro II (Jardins Mangueiral); 30ª
Delegacia de Polícia; Complexo Vivencial e Esportivo de São Sebastião (Vila
Olímpica); Inclusão dos bairros Bela Vista, Residencial Vitória e São Gabriel
no PDOT, dentre outros benefícios. O desenvolvimento de São Sebastião tem
ocorrido gradativamente, ano após ano e desde quando ela foi transformada em
cidade, em junho de 1993, e não no curto período de 2007|2010, como
erroneamente quer nos fazer acreditar o ex deputado da cidade.
Jornal Daqui: Qual é a
sua opinião a respeito das manifestações divulgadas por meio das redes sociais¿
LIRA: A princípio, justa, e as autoridades
precisam ouvir a vós que vem das ruas. Mas precisa ter foco! E não adianta
fazer manifestações contra o governo ou até mesmo promover uma revolução no
Brasil se quem está à frente usar de estratégias equivocadas e a maioria dos
eleitores continuar votando em candidatos descompromissados com a própria
comunidade. Para a elite
dominante quanto mais faminto e desinformado for o povo melhor! Mas, com o
surgimento da internet e das redes sociais, a massa que antes dormia desperta,
agora, para uma nova realidade, onde ela mesma processa e divulga as suas
próprias informações em questão de segundos, para o desespero de quem está à
frente do governo.
Jornal Daqui: Quais são
as suas considerações finais¿
LIRA: Sou uma pessoa simples, temente a Deus e, acima
de tudo, respeitador. Dediquei grande
parte da minha juventude à própria comunidade de São Sebastião. Essa foi uma
das missões que Deus me concedeu aqui na terra para ajudar o próximo. Me julgo
um homem de visão e que, muitas vezes, me antecipei no tempo para debater
questões humanitárias e ambientais como, por exemplo, o fim das armas atômicas,
preservação de nascentes, rios e matas ciliares. Sou grato a todas as pessoas
que, direta ou indiretamente, me apoiam nessa cidade. Tenho muitas ideias e
projetos que, caso eu consiga colocar em prática, toda a cidade será
beneficiada. Mas, para isso, irei precisar do apoio da população. Em outras
palavras, São Sebastião precisa recuperar o seu nome e de alguém que, de fato,
possa olhar para ela com carinho e dedicação.
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