Os
nossos manuais de História, ou melhor, de ESTÓRIA – os mesmos que
pintam os próceres e fundadores da nacionalidade e os grandes vultos da
História Pátria como verdadeiros “monstros” ou então “bufões” e que, à
luz dos ensinamentos de Marx, reduzem toda a epopéia de nossos maiores,
de nossos antepassados, a uma questão de interesses estritamente
econômicos – costumam colocar o golpe de Estado que derrubou a Monarquia
naquele fatídico 15 de novembro de 1889 como um fato que apenas teria
apressado o inexorável ocaso de um Império que – segundo eles – era
anacrônico e condenava o Brasil ao atraso.
Não
é preciso pesquisar muito, entretanto, para se chegar à conclusão de
que nosso Império nada tinha de anacrônico, que, longe de representar um
obstáculo ao desenvolvimento nacional, constituía a Coroa uma espécie
de alavanca que, conciliando Tradição e Progresso, impulsionava a
evolução econômica e social do País, e que o período monárquico, ao
contrário do republicano, foi caracterizado sobretudo pela Ordem e pelo
Progresso.
O
Império não foi perfeito, como bem observou Paulo Napoleão Nogueira da
Silva, na introdução de sua obra “Monarquia: verdades e mentiras”,
publicada pelas Edições GRD em 1994, já que nenhum regime é perfeito,
“porque em todos está presente o elemento ‘erro’, a falibilidade que é
própria dos seres humanos”.
A
maior parte dos não poucos erros e falhas do Império, tanto no plano
religioso como no político-social, decorre da influência nefasta das
idéias liberais surgidas na Europa dos séculos XVII e, sobretudo, XVIII.
Todos
esses erros e falhas, porém, nem sequer de longe se comparam a todos os
erros e falhas da República, regime em que não há – como assinalou
Nogueira da Silva – correspondência natural entre a estrutura do Estado e
a “realidade antropológica, sociológica, cultural e histórica” da
Sociedade. E é a carência de tal correspondência, como igualmente
ressaltou o jurista, “que faz com que a República nos mantenha
permanentemente marcando passo, ficando para trás em relação a países
menos dotados -, sobretudo, ficando distanciados das nossas naturais
perspectivas nacionais”.
De
modo que a restauração da Monarquia, ainda que seja – como foi durante o
Império – influenciada em certa medida por idéias liberais, será o
melhor meio de reconduzir o Brasil a seu destino histórico e de
construir a Sociedade efetivamente justa, harmônica, fraterna e humana e
a Pátria verdadeiramente grande, livre, unida, soberana e democrática
com que todos sonhamos.
Durante
todo o Império este País não teve, como acentuou Nogueira da Silva,
sequer “um único dia sob ditadura ou censura à imprensa”, de sorte que
não era por acaso que os presidentes argentinos Saens Peña e Bartolomé
Mitre se referiam ao Brasil daquele tempo como a “democracia coronada”, a
“democracia coroada”; como também não foi por acaso que Thiers, em
diferentes discursos perante a Assembléia Nacional Francesa, e William
Gladstone, dentre outros, tanto elogiaram o regime monárquico
brasileiro.
No
dia imediato ao da proclamação da República, ao receber o Cônsul Geral
do Brasil na Venezuela, Múcio Teixeira, o Presidente daquele país, Dr.
Juan Pablo Rojas Paúl – tendo lhe dito que pedisse a Deus para que sua
Pátria, governada por um sábio durante meio século, não fosse a partir
de então regida pelo primeiro “tirannello” que o Exército lhe
apresentasse – exclamou, sincera e profundamente comovido: “Se ha
acabado la única República que existia en América: el Imperio del
Brasil!”.
Quase
ao mesmo tempo, ao receber o embaixador brasileiro em Quito, o Supremo
Magistrado da nação equatoriana lhe ofereceu os pêsames, afirmando em
seguida que o Brasil acabara de cometer “o erro mais fatal de sua
História!”
Em
dezembro de 1914, o insuspeitíssimo Senador Rui Barbosa, antigo
Conselheiro do Império que se tornara um republicano dos mais ardorosos e
destacados, proferiu um memorável discurso ao Senado Federal em que
disse: “De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a
desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se
os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a
rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.
Esta foi a obra da República nos últimos anos.
No
outro regime, o homem que tinha certa nódoa em sua vida era um homem
perdido para todo o sempre – as carreiras políticas lhe estavam
fechadas. Havia uma sentinela vigilante, cuja severidade todos temiam, e
que, acesa no alto, guardava a redondeza, como um farol que não se
apaga, em proveito da honra, da justiça e da moralidade. Era o Imperador
Dom Pedro II”.
Quatro
anos mais tarde, Monteiro Lobato, em seu artigo intitulado “D. Pedro
II” e publicado na “Revista do Brasil”, salientou que “o fato de existir
na cúspide da sociedade um símbolo vivo e ativo da Honestidade, do
Equilíbrio, da Moderação, da Honra e do Dever, bastava para inocular no
país em formação o vírus das melhores virtudes cívicas”.
Ainda
em “D. Pedro II”, observou o autor de “Urupês” e de “Cidades mortas”
que “mais um século de luz acesa, mais um século de catálise imperial e o
processo cristalizatório se operaria por completo. O animal,
domesticado de vez, dispensaria açamo. Consolidar-se-iam os costumes;
enfibrar-se-ia o caráter. E do mau material humano com que nos formamos
sairia, pela criação duma segunda natureza, um povo capaz de ombrear-se
com os mais apurados em cultura”, sendo que, “para esta obra moderadora,
organizadora, cristalizadora, ninguém” – segundo o grande escritor e
patriota valparaibano – era “mais capaz do que Pedro II”, não havendo
“nenhuma forma de governo melhor do que sua monarquia”.
Em
julho de 1930, Plínio Salgado – então Deputado Estadual por São Paulo e
já um renomado e consagrado escritor e jornalista, tendo publicado, em
1926, a obra “O estrangeiro”, primeiro e maior romance social em prosa
modernista de nossa Literatura e havendo depois fundado, ao lado de
outros vultos do Modernismo, os movimentos literários conhecidos como
Revolução da Anta e Verde-amarelismo – assim afirmou, em sua carta ao
Dr. Manoel Pinto, escrita de Milão: “O Império legou à República um país
unido, homogêneo, vibrando pelo mesmo coração; a República, com mais
vinte ou trinta anos, terá completado sua obra de dissociação”.
Observações
parecidas estão presentes em muitos dos artigos que o autor de
“Psicologia da Revolução” e de “Vida de Jesus” escreveu em sua célebre
“Nota Política” no jornal “A Razão”, de que era o redator principal,
tendo como companheiros de redação jovens intelectuais como San Tiago
Dantas, Mario Graciotti, Alpínolo Lopes Casali, Nuto Sant’Anna, Silveira
Peixoto, Nóbrega de Siqueira, Marques Rabelo, Leopoldo Sant’Anna e
Gabriel Vendoni de Barros. Em meu artigo intitulado “O negro e o
Integralismo”, lembrei a importância deste matutino cujo proprietário
era o Dr. Alfredo Egídio de Souza Aranha e que “revolucionou a imprensa
da Capital Bandeirante e mesmo do Brasil e acabaria empastelado nos
distúrbios de 23 de maio de 1932”.
Em
fins da década de 1920, surgira em São Paulo o movimento patrianovista,
que – inspirado sobretudo nos ensinamentos da Doutrina Social da Igreja
e no pensamento de mestres tradicionalistas d’aquém e d’além mar, tais
como o sergipano Jackson de Figueiredo, fundador do Centro D. Vital, e o
alentejano António Sardinha, principal doutrinador do movimento
tradicionalista, patriótico e monárquico conhecido como Integralismo
Lusitano – pregava a instauração, no Brasil, de um regime monárquico
tradicional como aquele que vigorara nos áureos tempos do Império
Lusitano e em que o Estado organizar-se-ia à base da autonomia dos
Municípios e das agremiações profissionais, bem como a recatolização de
nossa Sociedade, defendendo a Ordem e a Justiça Social.
Reunindo
diversos intelectuais como Ataliba Nogueira, Sebastião Pagano e Antônio
Paim Vieira, o Patrianovismo tinha como principal líder o pensador,
poeta, jornalista, escritor e homem de ação Arlindo Veiga dos Santos,
que fundou e dirigiu também a Frente Negra Brasileira.
Àqueles
que desejarem saber mais a respeito do Patrianovismo, recomendo a
leitura do excelente verbete dedicado a este movimento por José Pedro
Galvão de Sousa, Clovis Lema Garcia e José Fraga Teixeira de Carvalho em
seu “Dicionário de Política” – de longe o melhor de quantos tenho lido
-, assim como da obra “Império e Missão”, da historiadora Teresa
Malatian.
Vejamos,
agora, algumas das informações que o Dr. Paulo Napoleão Nogueira da
Silva colheu em diferentes fontes, todas elas absolutamente insuspeitas,
e transcreveu em sua obra já aqui citada.
Na
edição de “O Estado de São Paulo” de 14 de setembro de 1991,
encontra-se a informação de que nos cento e um anos decorridos desde a
proclamação da República até aquela data, os preços mundiais elevaram-se
em vinte e três vezes, ao passo que no Brasil elevaram-se em nada menos
do que trinta e dois trilhões de vezes!
Segundo
a revista “Finanças Públicas”, editada pelo Ministério da Fazenda, em
seu volume 213 (maio/junho de 1960), no Império, entre 1840 e 1889, o
menor salário do País era de 25.000 réis, o que equivalia a 22,5 gramas
de ouro. Com a República, de acordo com Nogueira da Silva, só cento e
três anos mais tarde, em julho de 1993, os trabalhadores conseguiram
obter um salário mínimo de CR$ 5.600,00, o que correspondia a apenas 06
gramas de ouro!
Da
mesma fonte provém a informação de que o maior salário do Brasil
Imperial, o de Senador, foi de 300.000 réis; isto é, somente doze vezes
maior do que o menor salário. Em princípios da década de 1990, quando
Nogueira da Silva escreveu seu ensaio, o salário de Senador da República
correspondia a duzentas e quarenta vezes o salário mínimo!
É
ainda a mesma fonte que afirma que, entre 1840 e 1889, o Brasil teve
inflação de 1,58%. Neste mesmo período, a inflação da França, do Reino
Unido, dos Estados Unidos e da Alemanha oscilava entre 1,6% e 04%. Nos
cento e três anos que separam a imposição da República e o trabalho de
Nogueira da Silva, o acúmulo de inflação chegou a cerca de dez trilhões
por cento!
A
“Gazeta Mercantil” informa que, no Império, tinha o Brasil a segunda
maior frota mercante do Planeta, da mesma forma que o Ministério da
Marinha informa que, naquele período de nossa História, tínhamos a
segunda maior esquadra naval do Mundo. Hoje, em 2007, todos sabem o quão
longe estamos disto…
Provém,
por fim, do Ministério dos Transportes a informação de que, durante o
II Império (1840-1889), construiu o nosso Brasil cerca de 10.000
quilômetros de ferrovias. A República, em suas primeiras décadas,
ampliou até bastante o número de quilômetros de estradas de ferro, mas
depois desativou praticamente todas as nossas linhas férreas.
Um
dos grandes desacertos da República foi o de acabar com o Poder
Moderador. Com a extinção deste poder que sustenta, como nenhum outro, o
imprescindível equilíbrio entre Autoridade e Liberdade, sem o qual não
pode haver uma verdadeira e efetiva Democracia, extinguiram-se, ainda, –
como frisou João de Scantimburgo em seu artigo intitulado “Suma de
Filosofia do Poder Moderador” e publicado no n° 85 da “Revista
Brasileira de Filosofia” (janeiro/fevereiro/março de 1972) – “ e por via
de conseqüência, na estrutura das instituições políticas brasileiras, o
conselho de Estado, o conselho de ministros, o Senado vitalício e teve
início a debandada da classe dirigente, cuja evolução se processou,
através do tempo, em torno do cetro imperial.” Segundo o eminente
pensador, escritor, jornalista e Imortal, “não atinaram os republicanos
do século XIX, nutridos de inspiração alienígena e de doutrina
estrangeira, que abriam um vácuo cujo preenchimento se tem feito,
durante toda a história posterior do Brasil, por meios aleatórios e, no
exato rigor da palavra, por sucedâneos, aos quais falta a consistência
das instituições solidamente edificadas no espaço e no tempo”.
Nenhum
mal foi pior, todavia, do que aquele que Rui Barbosa chamou, no final
de sua vida, de “o mal grandíssimo e irremediável das instituições
republicanas”, que consiste, segundo a “Águia de Haia”, “em deixar
exposto à ilimitada concorrência das ambições menos dignas o primeiro
lugar do Estado e, desta sorte, o condenar a ser ocupado, em regra, pela
mediocridade”.
Tudo
o que afirmei até agora, neste artigozinho, pode ser resumido por este
pequeno trecho do já mencionado artigo de Monteiro Lobato: “De Norte a
Sul o povo lamuria a sua desgraça e chora envergonhado o que perdeu.
Tinha um rei, tem sátrapas. Tinha dinheiro, tem dívidas. Tinha justiça,
tem cambalachos de toga. Tinha Parlamento, tem ante-salas de fâmulos.
Tinha o respeito do estrangeiro, tem irrisão e desprezo. Tinha
moralidade, tem o impudor deslavado. Tinha soberania, tem cônsules
estrangeiros assessorando ministros. Tinha estadistas, tem pêgas. Tinha
vontade, tem medo. Tinha leis, tem estado de sítio. Tinha liberdade de
imprensa, tem censura. Tinha brio, tem fome. Tinha Pedro II, tem … não
tem! Era. Não é”.
Sabemos
que a longa e tenebrosa noite que é a idade materialista logo terá o
seu crepúsculo, dando lugar à Aurora da Idade Nova, cujo romper já se
anuncia. Esta Idade Nova, que Berdiaeff chamou de “a nova Idade Média”,
caracterizar-se-á acima de tudo pelo Primado, pela Primazia do Espírito.
Do
mesmo modo que a velha e mofada idade materialista dará lugar à Idade
Nova, dos escombros de nossa República oligárquica e plutocrática
nascerá, segundo Paulo Napoleão Nogueira da Silva, em seu ensaio tantas
vezes aqui citado, uma nova Monarquia, pois “a república tem sido uma
noite, de agonias intermináveis. Há noites que parecem se prolongar
indefinidamente. Mas, é lei natural, não há noite, por mais longa que
seja, que não preceda à Aurora.”
Também
não me resta dúvida de que esta República, que de República, aliás,
nada tem, “cairá por terra – como previu Antônio Vicente Mendes Maciel, o
profeta sertanejo mais conhecido como Antônio Conselheiro – para
confusão daquele que concebeu tão horrorosa idéia.” Se será substituída
por uma “Democracia Coroada” ou por uma nova República em que os
representantes do Povo serão todos homens competentes, íntegros e
honestos, só o futuro responderá.
Saibamos,
porém, que, caso advenha o III Império, será ele imensamente mais
glorioso do que o II, da mesma forma que a “nova Idade Média” será
enormemente mais grandiosa do que a antiga.
Victor Emanuel Vilela Barbuy