Fonte: Epáticas
Os tiranos modernos são eleitos pelo povo. Aquela imagem de que eram eleitos apenas pelo poder oligárquico já não é mais verdade. Hoje eles fazem questão de serem populares. E quanto mais populares, mais tirânicos são, pois têm apoio de uma massa e as massas não têm face ou opiniões unívocas.
Os tiranos modernos vêm do seio do povo e geralmente representam todos os vícios nele contidos. Para parafrasear Nietzsche porcamente, um tirano moderno não é nada mais que um superpopular. Se um povo é mesquinho, desconfiado e violento, seu “salvador” terá as mesmas características para ser assim reconhecido.
Todos os tiranos têm sua gênese em movimentos populares. Hitler surgiu da conjunção nefasta de crise econômica, desespero e excesso de democracia, que conduziu ao populismo exacerbado — se o “excesso” lhe parece incongruente, leitor, recomendo que pesquise acerca da célebre Constituição de Weimar. Mussolini, de matriz socialista, surgiu da crise política e do descrédito institucional oriundos da Primeira Guerra Mundial.
Se um povo tem problemas com distribuição de renda ou se crê — ou fazem com que ele acredite — vítima de sistemas viciados, provocando a cobiça pelo progresso alheio, a sereia que os seduz é o socialismo. Tão nocivo para o engenho e para o desenvolvimento quanto a subnutrição para uma criança. Quase todos os tiranos modernos e contemporâneos têm matriz e matizes socialistas. Não exatamente escancarada: Hitler perseguia-os, mas, ao mesmo tempo, tinha ideias de Estado totalitário. O que é um estado totalitário se não um “comunismo burguês”?
Mas o que eu gostaria de demonstra com esse texto é a gênese desse tipo de líder e creio que o caso mais emblemático é o de Nicolae Ceauşescu. Ceauşescu tornou-se o homem forte da Romênia após a morte do lide comunista Gheorghe Gheorghiu-Dej, em 1965. Torna-se presidente do Partido Comunista Romeno e, em 1967, presidente do Conselho de Estado.
Ceauşescu, como tantos outros, é o típico arrivista do poder. Nascido em uma família pobre, começou a trabalhar em uma fábrica, o que não o impediu de dedicar-se a pequenos furtos. Acabou preso porque roubara uma mala em uma estação de trem em Bucareste, mala que continha folhetos do Partido Comunista Romeno — à época ilegal. Acabou preso e de ladrão de galinha, foi alçado à condição de “perigoso agitador comunista”.
Acabou entrando em contato com os impressores dos panfletos, que o doutrinaram. Começou com atividades pró-PCR e acabou preso na famosa Prisão de Doftana, praticamente o núcleo de pós-graduação do PCR: ladrões de galinha que passavam a acreditar que matar e reprimir em nome do “povo” e do “futuro melhor” era lícito. Qualquer semelhança entre a prisão de Doftana e o sistema penitenciário paulista, o centro de especialização da bandidagem, deve ser mera coincidência.
Grande parte do quadro do governo de Chivu Stoica — primeiro ministro que forçou o Rei Miguel a abdicar — era oriundo da Doftana.
Ceauşescu aplicou todos os princípios aprendidos na prisão. Reprimiu e matou. Como teve uma vida de privações na infância, subiu-lhe a cabeça que, já que trabalhava pelo povo, poderia viver como um nababo. Palácios com torneiras de ouro, construções suntuosas, tudo para aplacar um ego gigantesco, uma egolatria mal disfarçada em abnegação, culto à personalidade. Qualquer semelhança com a Coreia do Norte não é acidental: após uma visita ao país oriental, Ceauşescu entrou em contato com a ideologia juche, que consiste numa estranha mistura de exaltação nacional, dos esforços coletivos, grandes manifestações simbólicas e culto à personalidade do líder.
Elementos nefastos que deram origem a um líder totalitário — chegou mesmo a usar o título de Conducător, usado pelo rei Carlos II e pelo Marechal Antonescu, da Guarda de Ferro, pró-nazista — e egocêntrico. Foi o único líder da Europa Oriental que terminou executado na queda do regime.
O que aconteceu no caso romeno é muito emblemático. Tiram o rei, que tem a origem do seu poder na tradição, representa não o poder efetivo, mas uma moral; e a turma da esquerda tende à amoralidade, a quebra dos parâmetros anteriores para dar nascimento ao “homem novo”. Porém, com o vácuo do poder moral, a tendência que o caminho seja franqueado para os vícios do povo, quando elementos sem a consciência real do que representa o poder chegam a ele e nele se instalam. Os vícios vêm apenas com uma demão de tinta dourada.
Por esses e tantos outros motivos, um poder extremamente popular pode tornar-se uma tirania; pois, personificado no tirano, o povo liberta-se e oprime-se ao mesmo tempo.
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